quinta-feira, março 15, 2007

 

Coisas de velho



Aquele velho de perto de setenta anos, bastante bem na vida, fazia da indústria o que os velhos ingleses faziam com o golfe, devoção.
Um de seus netos perguntou um dia: “Porquê passar toda a vida a fabricar tecidos?”
O velho teria sem dúvida respondido: “porquê e para quê viver se não se fabrica?”
Toda esta conversa, que não tratava da técnica da sua profissão, para ele era apenas um ruído negligenciável, desprezível.
Descendendo de uma espécie de agricultores que se transformaram depois em pequenos fabricantes de tecidos, com seus teares manuais, conseguiu criar assim o seu “império”. O velho abominava a sua origem rural e pobre e tinha uma necessidade enorme de trabalho e uma desconfiança incrível.
Dizia: “Todo o negócio que me propõem é mau, porque se fosse bom não viriam propor-mo.” “E dizia ainda: “Tudo o que não fazemos nós próprios, nunca é feito. Tudo o que nos ensinam é falso.”
A brutalidade das suas respostas faziam tremer os comerciantes de algodão e de lã, cujas mãos tremiam abrindo as embalagens. Tinha uma cor preferida: o azul. Imaginava-se um puro-sangue azul. Um homem que, descendente de lavradores, se imaginava possuidor de sangue azul. Sonhava ser alguém. Alguém mais que o que esses…
Não olhava a meios para atingir os fins que se propunha. Estou convencido que mataria ou roubaria para atingir a meta que se fixava. No fundo era um miserável, já que não conseguia viver bem consigo próprio. Tacteava à sua volta e nada encontrava que não lhe merecesse reprovação. Fazia-o há muitos anos. Desprezava todos os que para ele trabalhavam, pagava-lhes mal e mesmo assim achava serem bem pagos. Envelhecia no meio do seu árido império.
Só duas paixões eram o seu “amor”. O ódio e os negócios.
Morreu sem nenhum familiar a seu lado. Sem que nenhum dos que para ele trabalhavam o acompanhasse na sua derradeira viagem.
Morreu como sempre viveu. Só!

Comments: Enviar um comentário



<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?