quinta-feira, dezembro 21, 2006

 

Reacção do Dr. Sobral



Sem falar de si, o Dr. Sobral limitou-se a responder, em tom realmente lastimoso.
“Ai! – disse – foi o amor: o amor, a consolação do género humano, o conservador do universo, a alma de todos esses seres sensíveis, o termo amor”.
“Ai! Eu conhecia-o – disse Vasili das couves Barbosa – eu conheci esse amor, esse soberano das almas, essa alma da nossa alma. Nunca me proporcionou mais que um beijo fugaz e vinte pontapés no traseiro. Como é que essa bela causa vos pôde causar tão abominável efeito?”
O Dr. Sobral respondeu-lhe, nestes termos:
“Ó meu querido Vasili. Conheceste o “Arrebenta”, o lindo criado da augusta condessa? Provei nos seus braços as delícias do Paraíso, que causaram estes tormentos infernais de que me vês devorado; ele estava contaminado, talvez tenha morrido disso mesmo. O “Arrebenta” recebera esse presente de um sapateiro muito sábio, que tinha remontado à origem: o sapateiro recebera-o de uma velha baronesa, que o recebera, por sua vez, de um capitão de cavalaria, que o devia a uma marquesa, que o tivera de um pajem, que o recebera de um jesuíta que, em noviço, o tivera, em linha directa, de um dos companheiros de Cristóvão Colombo. Por mim, não o darei a mais ninguém, pois vou morrer.”
Ó Dr. Sobral – exclamou Vasili das couves Barbosa – que estranha genealogia! Não estará o Diabo na sua origem?”
“Nada disso – replicou aquele grande homem – era coisa indispensável, no melhor dos mundos, um ingrediente necessário: se Colombo não tivesse apanhado, numa ilha da América, essa doença, que envenena a origem da geração, que tantas vezes, mesmo, impede a própria geração e que é, evidentemente, o oposto do grande objectivo da natureza, não teríamos o chocolate nem a cochinilha. Ela desenvolveu-se muito, entre nós, sobretudo nas grandes corporações e exércitos, composta de honestos estipendiários bem-educados, que decidem o destino dos juízes.
Pode afirmar-se até que, ao combaterem trinta mil homens, em batalha em linha, contra igual número de tropas, há, mais ou menos, vinte mil siflíticos de cada lado.

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